sábado, outubro 30

Manhã de chuva


Olhei para os montes, nublados e cinzentos. Olhei para a rua, onde os vizinhos encostaram uma fileira de abóboras contra o muro. Sopra um vento que ainda não é de tempestade, mas já  de mau agouro, empurrando nuvens que vão descarregar as águas do Dilúvio.
Olho as nozes no prato e um relâmpago da memória traz-me uma manhã da infância, revejo as nogueiras antigas na encosta junto da horta. Sentado no chão, examino os deditos que não conseguem retirar aquela casca que os deixa melados e com um sujidade verde.
A rádio fala de explosivos, terrorismo, o tsunami em Sumatra, mas porque não atento oiço palavras soltas, vazias de sentido, só ruído. Os gatos aninharam-se contra a caldeira do aquecimento. A água enche o pátio. Pancadas de um machado a rachar lenha. Vozes indistintas. Passos. O cheiro penetrante de um lume de estevas.
Como é longa uma manhã assim.