quarta-feira, outubro 12

Pesadelo

Se disser que me preocupa e entristece, ninguém vai acreditar. É o corrente, os olhos habituam-se, quem passa atentará num ou noutro detalhe, mas não vai perder tempo nem pensamento com o que aquilo tem de lúgubre.
A esplanada da bomba de gasolina, ontem a meio da tarde: quatro matulos na força da vida, derreados, cada um em sua mesa, olhando a bica vazia, trocando de vez em quando um dichote, um piscar de olho, um sorriso alvar.
Se fossem mexicanos deitados ao sol, as caras tapadas pelo sombrero, dois ou três cães por companhia, a cena seria pitoresca e folclórica. Nesta caso não é. Talvez se refugiem ali para esquecer, a fingir que repousam do trabalho,  lhes sobra tempo por estarem "entre dois empregos". Que abrem uma pausa nos problemas que a vida traz. Que não aguentam a rezinga das mulheres.
Mil desculpas poderia arranjar, umas válidas, ou então piedosas, nenhuma satisfatória. O que  de facto não interessa, pois o que me apertou o gasganete foi a ideia de que, não fosse o instinto que me levou a fugir, a minha vida poderia ter sido assim.
Quando o senhor disse que o depósito estava cheio e eram quarenta euros, tive a impressão de acordar de um pesadelo.