domingo, abril 1

O carreiro

Olho o carreiro na encosta e volto à meninice, às tantas vezes que o desci a correr, ansioso por chegar à ribeira. Imaginava ali o mar, na ponte medieva um castelo, mudavam-se os canaviais em floresta virgem, os melros em águias e condores. Atravessava a vau, pronto para o ataque dos crocodilos. Quando lá passo recordo, junto do muro, o lugar onde matei dois índios e, para lá das hortas, a clareira onde vi a cavalgada de Yala, a Vingadora, e as suas belas  amazonas. As cabras ao longe  eram os meus búfalos, eu o cowboy perito no laço e no tiro rápido dos Smith & Wesson que me pendiam do cinto.
Hoje cedi à recordação e fui carreiro abaixo, tropeçando nos calhaus, amparado a uma bengala , incapaz de sonhos e visões. Sentei-me na ponte. Olhei em redor, perguntando-me que fazia ali, e se teria pernas para o quilómetro e pouco de subida agreste.