segunda-feira, outubro 17

Ares de leão

(Clique)

É interessante vê-lo quando chega ao café: a porta abre-se e durante dois ou três segundo nada acontece, a pausa teatral antes do galã apare­cer no palco.
Surge então, grande, pesado, a cabeça leonina erguid­a, os olhos flamejantes. Entra, roda sobre si mesmo a fechar a porta, cumprimenta este, acena a outro, a passos medidos procura uma mesa.
Escreve, pinta, canta, represen­ta, esculpe, compõe, é pianista talentoso, realiza performan­ces, vê-se com fre­quência na televisão, ouve-se com fre­quência na rádio. Raro passa semana sem que num ou noutro jornal não apareça escrito seu, ou não se fale das suas muitas acti­vidades.
Verdadeiro furacão que é causa ciúmes, e já me tenho perdido a sonhar sobre que extraor­dinário poder pos­sui quem realiza tanto, no mesmo tempo em que eu tão pouco faço.
A minha inveja, porém, vai menos para o que ele faz, do que para o modo como se mostra. Eu francamente gostaria de saber entrar assim no café, vestido de preto, o grande cachecol vermelho enrolado no pes­coço, cabeça ao alto, e aquela esplêndida segurança de si mesmo.
.............
Publicado no CM e aqui.